segunda-feira, 19 de outubro de 2009

As relações existentes entre os açorianos de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul

As relações existentes entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul são diversas no que tange a imigração de povos europeus. Alemães, Eslavos, Italianos entre outros grupos menores, trouxeram um grande número de famílias para as terras compreendidas entre os dois estados sulinos. Todavia, os laços que unem esses dois estados não se restringem somente aos povos da parte centro oriental da Europa. Um arquipélago remoto do Atlântico, denominado Região Autônoma dos Açores, localizado a 1500 Km da Península Ibérica, mais precisamente entre os paralelos 37 e 39 norte, coloca-nos diante de fatos históricos interessantes e que nos levam a perceber a importância de resgatarmos esses acontecimentos e disseminá-los à sociedade. O relativo abismo cultural existente atualmente entre as cidades de formação açoriana do litoral catarinense e gaúcho, deve-se em parte, a falta do resgate histórico do povoamento açoriano nos dois estados, salvo ao trabalho incessante de núcleos de estudos açorianos (NEA), como o da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC e de outras instituições. Diversas são as relações históricas encontradas entre esses dois povos, contudo, não ficam somente no elo interiorano, Rio Grande do Sul e Santa Catarina possuem uma conexão litorânea histórica conduzida por açorianos que aportaram a partir do ano de 1748 no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina.
Dentro deste contexto, estão inseridos as capitais dos dois Estados. Porto Alegre e Florianópolis possuem peculiaridades em suas formações, as duas capitais foram inicialmente colonizadas por portugueses, e com grande influência açoriana na formação de sua sociedade. Um paralelo breve entre as duas cidades permite-nos dimensionar a influência açoriana nesses dois povoados.
A história da cidade de Porto Alegre remonta o ano de 1772 quando o povoado primitivo é elevado a condição de Frequesia, em virtude da queda de Rio Grande, então capital da província e dominada pelos espanhóis. Com isto, familias inteiras refugiaram-se em Viamão. Todavia, esta região já apresentava um núcleo populacional, principalmente, estancieiros portugueses, índios e escravos. Em 1752, chega ao então Porto de Viamão as primeiras famílias açorianas, dando início ao núcleo urbano da futura Porto Alegre. A influência açoriana deixou um legado cultural em todo o litoral lagunar gaúcho, destacando as cidades do São José do Norte, Mostardas e Tavares, esta última ainda cultiva fortemente sua tradição açoriana com a Corrida da Cavalhada, Os Ternos Juninos e os Ensaios de Pagamentos de Promessas, além do artesanato de lã de ovelha, com os cobertores açorianos, ponches, palas, chales, mantas e tergões.
Florianópolis por sua vez apresenta uma relação visceral com o Arquipélago dos Açores. A sua história inicia-se com seus primeiros habitantes, os homens de sambaqui, caçadores e coletores de moluscos, em seguida, segundo estudos, vindos da região do Paraguai, povoaram a ilha e a parte continental, os Tupis-Guaranis, denominados pelos europeus de Carijós. A póvoa de Nossa Senhora de Desterro dá-se no ano de 1675, pelo Bandeirante Vicentista, Francisco Dias Velho, juntamente com cem homens para um empreendimento agrícola. Em março de 1748, estabeleceu-se a primeira colônia de portugueses açorianos às margens da Lagoa da Conceição, no interior da Ilha de Santa Catarina, logo em seguida a de Santo Antônio de Lisboa e, outras no continente, como as de São José da Terra Firme, nome até hoje do respectivo município, Enseada de Brito, atualmente pertencente ao município de Palhoça, São Miguel, bairro, hoje, do município de Biguaçu e por fim, Vila Nova, bairro integrante na época atual, do município de Imbituba. Cabe salientar também, a presença marcante dos açorianos nas cidades de Bombinhas, Porto Belo, Governador Celso Ramos, Itajaí, situadas ao norte de Florianópolis.
As influências regionais definiram algumas peculiaridades entre os povos açorianos ao longo do território brasileiro, desde do Maranhão até o Rio Grande do Sul. Contudo, nas cidades que compõe o povoamento açoriano, a pesca, permanece presente e de certa forma é um traço que consolida a unidade açoriana no litoral catarinense e gaúcho. Os primeiros intercâmbios pesqueiros datam de 1954, onde os irmãos, Francisco Alexandrino Daniel “ Seu Chico Doca” e Eusébio Alexandrino Daniel “Seu Binho”, juntamente com um grupo de pescadores, também moradores, atualmente conhecido como Bairro do Campeche, partiram em direção a cidade do Rio Grande/RS. As primeiras trocas de experiências deu-se por meio da técnica e materiais utilizados para a pesca. Enquanto aqui utilizava-se a canoa bordada, na qual consistia no talhamento do tronco do Garapuvu, no litoral gaúcho utilizava-se uma canoa de madeiras latitudinais. A forma de arrasto também era diferente, segundo relatos de “ Seu Chico Doca”, na Lagoa dos Patos utilizava-se uma técnica chamada de “terno de fora”, na qual circundava-se a tainha com quatro redes, formando um grande circulo. Os pescadores catarinenses percorreram todo o litoral gaúcho, de Rio Grande a Santa Vitória do Palmar e fazendo também o sentido contrário, até Torres. Essa troca de experiências e vivências seguiram pelas gerações futuras, influenciando sócio-economicamente as comunidades envolvidas dos dois estados.
O que permeia esta expedição é identificar as relações existentes entre os habitantes de origem açoriana dos dois estados e também identificar as suas diferenças enquanto habitantes de estados que transitam entre a homogeneidade e heterogeneidade cultural.
Objetivando com isto, traçar um paralelo entre a cultura agrícola e pesqueira tradicional dos açorianos que colonizaram o litoral catarinense e gaúcho, observando também as manifestações da culinária dessas culturas.

Eduardo Daniel da Rocha
Equipe Expedição Litoral Lagunar

2 comentários:

  1. Paulo, parabéns pela abordagem histórica que estão fazendo. Para além das queixas que se fazem mutuamente catarinas e gaúchos (oioió istepô, mas bha tchê índio véio!!), o vínculo colonizador comum de fato é o mais importante. Desejo sucesso na viagem, muita curtição e que mantenham-se firmes nesse resgate histórico.
    Parabéns e Forte abraço
    Wolney

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  2. Infelizmente os homens citados " Euzébio e Franscisco" já se foram. Meu vô e meu tio respectivimante. O seu Euzébio,como era conhecido, faleceu semana retrasada, no dia 06 de setembro. Fico feliz em saber que eles, minha familia, fizeram parte da história.

    abraço

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